Ariadne Selene, ex aluna do Anglo de Raul Soares, atualmente cursando o segundo período de Jornalismo na Universidade Federal de Ouro Preto, elaborou uma entrevista com um morador de Raul Soares, que narra como era a cidade no passado, e como foram surgindo as transformações, até chegar aos dias atuais.
Parabéns Ariadne pela sua bem elaborada entrevista, te desejamos muito sucesso nos estudos bem como na futura vida profissional.
Parabéns Ariadne pela sua bem elaborada entrevista, te desejamos muito sucesso nos estudos bem como na futura vida profissional.
A clichê cidadezinha do interior
Por Ariadne Selene
Raul Soares, uma cidadezinha do interior
de Minas Gerais, fundada por moradores de Mariana (MG), já se
estabelece como tal há quase um século, porém houve mudanças drásticas
no município e em quem vive lá. José Cupertino dos Santos, de 76 anos,
viúvo com nove filhos, 32 netos e incontáveis bisnetos, sempre morou em
Raul Soares, viu a cidade crescer e ajudou na sua construção. Ele conta
como era a cidade antigamente – por volta dos anos 50 – quando ainda era
criança, e conta como ela está agora.
Ariadne Selene - Como era a situação da época?
José Cupertino - Já tinha a rua Bom Jesus, e a pracinha do Coreto, né.
Tinha ali em frente ao Benedito, no meio da rua, um pé de manga, se é
esse tipo de informação que você quer. A gente quando era menino saía da
aula e ficava lá, brincando no pé. Eu não sei, mas meu pai dizia que
ali onde é o Coreto já foi uma lagoa, você sabia disso? Mas eu não sei,
meu pai é que falava. Aqueles prédios lá atrás (da pracinha do Coreto),
tudo aquilo ali já existia na época. (sic)
AS – Qual era seu sustento?
JC - Eu comecei a trabalhar com 11 anos, filha. Era difícil, naquela época não tinha muita indústria, né. Minha mãe lavava roupa pro Hotel Azul e pro
Hotel Natalino. E eu, quando saí do grupo (se refere à escola Benedito,
em que se entrava com sete anos e saía com onze, se não tomasse bomba) e
não tinha tomado bomba, com 11 anos minha mãe me deu uma caixa de
engraxar, e me pôs na rua pra engraxar sapato. Eu dava o dinheiro pra ela, né, e aí ela comprava pão. Era ela que tinha que sustentar eu e meus irmãos, porque meu pai saía e ficava uns 15 dias fora, ia pro meio do mato e dormia lá (seu pai era carpinteiro). E como ele ficava fora de casa, cê entendeu, a gente tinha que arrumar um jeito de trabalhar. (sic)
AS - Qual o fato mais marcante que o senhor se lembra?
JC - Um que eu não me
esqueço até hoje, eu devia estar com uns 10 a 12 anos, por aí, não vou
te dizer nome porque eu não me lembro. Na época a política era PSD e UDN
só, era Luiz Domingo e Geraldo Grossi, mas quem mandava aqui mesmo
naquela época era Luiz Domingo. Não sei qual foi o partido, que foi sortar
foguete atrás da igreja, que era no lugar que é o jardim… Eu estava
engraxando na rua, entendeu, e tinha, sempre nas eleições, polícia de
fora aqui, na cidade, pois o lugar era pequeno. Eles (a polícia) foram
lá e tomaram os foguete do pessoar que tava sortando, não sei o motivo, porquê, isso deve ser o outro político contrário que mandou, né.
E levaram (os foguetes) pro Hotel Brasil, era aonde é o Banco do Brasil
hoje. Menina, você vê a quantidade de gente que juntou lá em volta, pra pegá os foguete de volta! Ali onde é a estação tinha os trilhos de linha, né,
aquilo tava lotado de vagão, do lado e do outro, só tinha o lugar de
passar, aonde é até hoje a passagem. A polícia desceu e chegando perto
dos vagões, batia o joelho no chão e metia o fuzil pra lá, os doidos subiam nos vagões e vinha, pulava em cima da polícia, tomava fuzil, tomava tudo. Tomava o fuzil pra deixar eles desarmado. Agora, não me lembro se tomaram os foguetes ou não. (sic)
AS – Quando foi possível notar um desenvolvimento aqui?
JC - Eu vou falar uma
coisa, eu vou ter que mexer com política, eu não gosto. Creio eu, filha,
que foi quando o Geraldo Grossi começou a comandá, tem muitos que não aceitam, entendeu. (sic)
AS – Por quê?
JC - Porque ali, onde é o Colégio Estadual Regina Pácis (Cerp) agora, conforme eu disse procê,
tinha uma porteira, dali pra lá era só fazendeiro. Ele (Geraldo Grossi)
conseguiu comprar quatro alqueire de terra , que pertence o colégio até
hoje, isso aí você pode vê que é. Onde tá a piscina da Associação,
entendeu, o Polisportivo, o Estado comprou aquilo tudo. Não foi o
Geraldo, foi o Estado, né. O Estado comprou aquilo, mas aí eu
já tava homem formado já, não era criança mais. Não lembro quantos anos
eu tinha mas devia ter uns 23, 24. Foi o Geraldo Grossi que fez o
asfalto que vai daqui até Rio Casca também. (sic)
AS – O senhor ajudou a construir
o Cerp (Colégio Estadual Regina Pácis), correto?! Como foi, para o
senhor, na época e como é agora?
JC – Eu era pedreiro, me chamaram pra
construir o colégio, porque só eu fazia aquele tipo de trabalho aqui.
Eu comandava a turma toda. O Cerp hoje tá por baixo, acabou. Evoluiu
demais, porque tinha só outra escola por aqui, que era particular. Pobre
não podia estudar, coitado. Aí quando abriu a escola o pobre ia era pra
lá, estudar. Melhorou na época, hoje não. (sic)
AS – O senhor acredita que Raul Soares já esteve melhor?
JC - Oh, filha, não teve nem pior e nem melhor, só cresceu.
AS – Por quê?
JC – Porque antes tinha indústria aqui, né.
Tinha a da enxada, de tecido, hoje não tem nada. Abriram da enxada de
novo mas não tá muito segura… Ninguém usa enxada mais, porque antes você
usava enxada pra tudo, agora não, agora é só pra construção mesmo,
entendeu. A enxada perdeu o valor. Mas que a empresa Tarza era uma das
melhores do Brasil, isso era. Exportava pra tudo quanto é canto. (sic)
AS - Como é participar da história de uma cidade?
JC - Pra mim,
me sinto muito orgulhoso. Porque a gente vê crescendo, vê a evolução,
não tinha vila nenhuma, ali onde é o morro de Hospital, você subia ali
tudo e não tinha nada, eu vi aquilo tudo crescendo. Praqueles lado lá (Bairro Santana), também não tinha nada. Essa rua aqui também, não existia, entendeu. Vi tudo isso crescendo. (sic)
AS – Bom, muito obrigada pela entrevista. O senhor gostaria dar um recado para as pessoas que moram aqui?
JC – Dá um recado pras pessoas que moram aqui?! Trazer mais indústria pra cá, pra crescê. (sic)
Raul Soares, como tudo indica, é apenas
mais uma cidade clichê de interior. Foi construída aos poucos, com ajuda
dos próprios moradores. Todavia, só quem já morou ou ainda mora lá para
saber os prazeres e dissabores que ela possui. A cidade pode ter mudado
significativamente, ainda assim, é possível perceber o ar aconchegante,
o clima chamativo que trouxe e continua trazendo moradores para esse
agradável município.
As imagens são arquivo da cidade e podem ser encontradas neste site: http://raulsoares-fotosantigas.blogspot.com.br/Fotos atuais de Raul Soares tirada por Vinícius G. Valle:
(http://viniciusgvalle.blogspot.com.br/)
Os leitores que desejarem visitar o site, favor clicar no link abaixo:
http://www.jornalismo.ufop.br/tecer/?p=351
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